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... antes, acordei a pensar que é o teu dia. Mas hoje não passei grande parte do dia a pensar que não podia me esquecer de te ligar, por saber que, tal como Conan Osíris tão bem escreveu, não há telemóveis para ligar para o céu... muito embora os caminhos das nossas vidas tivessem tomado rumos diferentes, separando-nos umas boas dezenas de quilómetros, muito embora a loucura dos afazeres do dia-a-dia nos impedisse de estarmos juntas tantas vezes quantas as que desejávamos, nós sabíamos e, principalmente, sentíamos que estávamos sempre lá uma para a outra. Hoje não te vou ligar, hoje não te vou ouvir falar do enorme cansaço que a tua atividade profissional te dava, nem da alegria imensa que esse mesmo cansaço te trazia, hoje não nos vamos rir de alguma parvoíce que te diria, do tipo "que tal são os 47? Espero que sejam bons porque senão ainda tenho 7 meses para impugnar os meus, mais uma dezena de anos a lutar na justiça portuguesa, posso ficar tranquila nos meus 46 por uns tempos valentes", hoje não vamos falar das trivialidades das nossas vidas, não vamos reavivar memórias dos momentos tão fixes que tivemos juntas, nem fazer promessas de que tiraríamos umas horas para um almoço ou jantar, hoje não te vou ouvir dizer que gostas muito de mim... tenho tantas saudades tuas, minha Querida... um beijo enorme para ti onde quer que estejas, um dia voltaremos a estar juntas!
... onde quer que estejas, que o Sol brilhe sempre e que o mar te receba em águas tranquilas e amenas.
Gosto tanto, mas tanto de ti que quero muito que as nossas vidas se voltem a cruzar. Foste, és e serás sempre das minhas pessoas, daquelas que mesmo estando ausentes, estarão sempre perto. Por isso, até breve, minha Querida.
... sem o teu sorriso, sem o teu abraço, sem as tuas gargalhadas, sem as tuas implicâncias, sem as nossas conversas, sem os nossos arrufos, sem as nossas refeições em que tu fazias questão de me servir o melhor vinho, sem as tuas anedotas, sem as tuas lágrimas perante as minhas lamechices, sem as tuas teimosias, sem as tuas larachas, sem as tuas histórias, sem o teu colo...
... um mês que estive pela última vez com o meu pai, era domingo e convidei-o a ele e à minha mãe para almoçar a bela da caldeirada tão do seu agrado, comeu e bebeu com a mesma satisfação que sempre lhe conheci, no entanto, falou pouco e isso foi notado por todos os que estavam à mesa, desde há algum tempo que se dizia mais cansado... fez ontem um mês que tive a última oportunidade de lhe dizer o quanto me orgulho de ser sua filha, não disse... faz amanhã um mês que perdi para sempre toda e qualquer oportunidade de lhe dizer o que quer que seja. E eu ainda não acredito...
... enquanto o coração se vai recompondo.
... assim da mesma forma inesperada, fria e crua com que escrevo este post. Morreu na rua, sozinho, tombou na terra gravilhada golpeado por um AVC fulminante que não lhe deu sequer um minuto para se despedir da vida que tanto amava. Nesse dia, o meu pai saiu à rua para a sua já habitual caminhada matinal, longe de saber que a morte sairia também à rua indo ao encontro dele naquele caminho entre canaviais...
... quem diria que o Mestre que tanto idolatrava haveria de descrever metaforicamente, anos antes, a sua morte despida de metáforas...